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A série documental da Netflix (2023) – How to Become a Cult Leader – reúne os mais conhecidos e perturbadores casos de seitas religiosas existentes ao longo dos anos. Conta com os relatos de ex-participantes e familiares e com a narração de Peter Dinklage, que investiga e faz uma síntese das principais teorias e técnicas usadas pelos supostos líderes para arrebatar o seu rebanho. Ao longo da série, vamos percebendo que há um modelo de manipulação que se repete em todas as seitas.

Lembrando que também é possível assistir na Netflix outros documentários que abordam líderes de seitas e movimentos religiosos questionáveis. Alguns exemplos incluem Wild Wild Country, sobre Bhagwan Shree Rajneesh, ou Osho, como é popularmente conhecido, e sua comunidade em Oregon; Holy Hell, sobre a seita Buddhafield, liderada por Michel Rostand; e The Family, sobre o grupo religioso secreto conhecido como The Fellowship, e João de Deus: Cura e Crime, que recentemente abalou o Brasil.
A Netflix teria material suficiente para fazer uma série documental só com líderes religiosos brasileiros, tais como: Gê Marques, ou Antonio Alves Marques Junior, do Reino do Sol de Mairiporã; Padre Rodrigo Maria, ou Jean Rogers Rodrigo de Sousa, padre de Anápolis (GO); Sri Prem Baba, ou Janderson Fernandes de Oliveira, famoso por seus best-sellers de autoajuda e guru de famosos, acusado de abusar de discípulas em São Paulo, afirmando que faria nelas exercícios tântricos; Jair Tércio Cunha Costa, ex-grão-mestre de uma loja maçônica na Bahia e desenvolvedor de uma doutrina pedagógica que era estudada em retiros espirituais promovidos por ele todas as semanas; e, por fim, mas não o último, porque a lista é imensa e cresce todos os dias – André Correa Lanzoni, condenado pela Justiça de Campinas (SP) a 52 anos e 6 meses de prisão, pelo crime de violação sexual mediante fraude contra pacientes que buscavam cura.
O modus operandi dos supostos líderes religiosos consiste em:
Manipulação psicológica: os líderes religiosos usam técnicas de manipulação emocional e mental para atrair e controlar seus seguidores, o que pode incluir lavagem cerebral, isolamento, coerção e exploração emocional. São especialistas em identificar pessoas vulneráveis e, sorrateiramente, vão afastando seus seguidores de seus familiares e amigos. Em um primeiro momento, exaltam os seus seguidores para que se sintam pessoas privilegiadas, eleitas e detentoras de informações especiais de natureza mística ou oculta, em relação às quais a reles humanidade amarga em ignorância. Dessa forma, cria-se o NÓS e o ELES: os eleitos iniciados e o resto da humanidade. Com frequência, a sede da seita é no campo, longe dos grandes centros. Trabalhar de graça na terra, seja no plantio, na colheita, na cozinha ou na limpeza, faz parte do processo de cura, iluminação e transcendência.
Relações sexuais com o líder são também outra maneira de transcender, de obter cura ou desbloquear a energia vital. “O remédio está na ponta da agulha”, mas, para que esse remédio funcione, ninguém pode saber; estabelece-se um pacto de silêncio.
Há um controle psicológico para que os membros do grupo não falem a respeito do que acontece na “sala sagrada” de cura.
Humilhar alguém do grupo diante de todos é uma prática adotada para minar a autoestima dos seguidores, que vão, cada vez mais, se tornando dependentes do líder religioso.
A adoção de um uniforme, um tipo único de roupa, saias longas, cabelos longos ou cabelos raspados é uma maneira de despersonalizar, retirar pouco a pouco a individualidade para que se forme uma única individualidade – a individualidade do grupo.
O líder, geralmente, não é acessível; é intermediado por uma assessora ou por um grupo de ascetas que o protegem.
Características de líderes de seitas: carisma, narcisismo, manipulação e habilidades de persuasão são habilidades utilizadas para atrair seguidores e exercer poder sobre eles.
Dinâmica de grupo em seitas: as seitas criam uma dinâmica de grupo exclusiva e fechada, visando controlar e moldar a visão de mundo de seus seguidores. Os líderes utilizam táticas como doutrinação, rituais, recompensas e punições para garantir a adesão e lealdade total dos membros.
Impacto nas vítimas: os efeitos psicológicos e emocionais que a manipulação por líderes de seitas pode ter sobre seus seguidores são devastadores. A perda da identidade, do controle, dos relacionamentos e da liberdade pode deixar marcas profundas nas vítimas, mesmo após deixarem a seita.
Recuperação de ex-seguidores: a jornada de recuperação e reconstrução de vida de pessoas que conseguiram escapar de seitas inclui buscar apoio psicológico e emocional para lidar com os traumas e reconstruir suas vidas fora da influência da seita.
Enfim, a série documental oferece uma visão detalhada e perturbadora sobre o funcionamento das seitas e a manipulação exercida por seus líderes. Ela busca conscientizar o público sobre a existência dessas práticas e ajudar a prevenir o envolvimento em grupos de risco, uma vez que não existe uma solução milagrosa. Saiba que Deus não tem uma missão especial para você. Você é apenas um dos 7,97 bilhões de pessoas que há no planeta.
Sua missão é viver em comunidade de maneira ética, e transcender é encontrar uma nova resposta para uma velha pergunta no aqui e agora – e isso não é mágico. Você não precisa de um líder que indique o caminho; siga a sua sabedoria, a sua intuição.
Se você pertencer a uma seita ou a um grupo esotérico e tiver questões sexuais envolvidas, saiba que não é espiritualidade – é abuso. Caia fora, denuncie. Trata-se de violação sexual mediante fraude – artigo 215 do Código Penal –, estelionato sexual, comportamento caracterizado quando o agente, sem emprego de qualquer espécie de violência ou ameaça, pratica ato libidinoso lançando mão de meios fraudulentos que impeçam a livre manifestação de vontade da vítima.
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