Geralmente, quando um profissional fala sobre si mesmo, na verdade fala sobre sua formação acadêmica, resume seu currículo e narra sua trajetória profissional, deixando de lado o ser humano em sua totalidade. Ele se limita a falar sobre seu papel social, mas um profissional não é apenas a representação social que assume. Ele é um ser-no-mundo, um ser-em-relação, um indivíduo com experiências, valores e sentimentos que moldam sua atuação profissional.
Meu trabalho envolve seres humanos que desempenham diversos papéis sociais em diferentes áreas. O que nos torna iguais, independentemente de nossas funções ou contextos, é nossa humanidade. E meu discurso, enquanto terapeuta, versa sobre a necessidade do encontro genuíno entre duas pessoas. É na relação terapêutica, entre cliente e terapeuta, que a cura se manifesta, pois, é a própria relação que cura. Guimarães Rosa, em sua obra, nos lembra que a experiência se constrói no trajeto, entre a partida e a chegada: "o real não está na saída nem na chegada: ele se revela para nós no meio da travessia".
Seguindo esta linha de pensamento, decidi que ao escrever sobre a psicóloga que sou, primeiramente, quero falar sobre o ser-no-mundo que venho sendo, quero me aproximar daquele que me lê, pela humanidade que nos torna iguais e não pelos cursos que fiz e que continuo fazendo. Não se trata de negar a importância de uma boa formação profissional, se trata de ter sempre consciente de que tudo o que o outro me traz, devo fazer uma èpoche fenomelógica, colocar em suspensão toda a teoria, os meus próprios julgamentos e a minha crença sobre a realidade para poder estar com o outro genuinamente.
Em nossas aulas de fenomenologia, Adriano Holanda, costumava nos dizer; "devo-me abster dos 'a priori' que me acompanham, devo me apresentar de maneira ingênua como a criança que não sabe e procura saber". Carl G. Jung nos ensina: "conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana".
Então vamos lá!
"Sou a segunda geração de imigrantes italianos que fugiram da miséria e da fome que assolava a Itália - minha bisavó paterna, uma mulher do século XIX, que curiosamente sabia ler e escrever, certo dia colocou a família em um navio e atracaram no Porto de Santos. Deixaram a cidade de Argenta (Ferrara) para nunca mais voltar e se aventuraram em terra estrangeira com o sonho universal de enriquecer.
Não enriqueceram, e em muitos momentos, a vida foi madrasta. Assim é também, a história da minha mãe, filha de italianos, que se casou com meu pai aos vinte anos. Ela costureira e ele, músico e artesão que fabricava sapatos manualmente com igual esmero de um joalheiro.
Nasci em 1960, ano da descoberta da pílula anticoncepcional (fui a oitava filha a nascer), penso que se a ciência tivesse adiantada em pelo menos cinco anos, talvez eu não tivesse nascido.
Cresci em plena ditadura militar (1964-1985), muitos livros eram proibidos e não sei como eles chegavam a nossa casa pela mão de minhas irmãs. Nem eram livros tão bons assim, mas tinham o sabor do proibido e isso por si só bastava. Naquele tempo, parecia que eu era muito mais nova que minhas irmãs, hoje já não é mais assim, e elas não deixavam que eu os lesse. Então, eles ficavam proibidos em dobro, pela censura do governo e pela censura doméstica, e por esses motivos, eu os lia embaixo da cama. Iniciei meu gosto pela leitura de uma forma desconfortável e com a leitura de livros suspeitos, como "Eu e o Governador" de Adelaide Carraro (1936-1992) e o "Último Tango em Paris" de Robert Alley (1972), não tenho lembrança do meu primeiro sutiã, mas lembro com nitidez dos dois primeiros livros lidos.
Naqueles anos éramos jovens politizados e sonhávamos em mudar o mundo, mas foi o mundo que nos mudou e aos poucos passamos a fazer parte e usufruir daquilo que combatíamos - o capitalismo.
Os cursos técnicos estavam em alta, o país precisava de mão-de-obra especializada e barata, e como de costume, não havia verba para investir em educação. O caminho mais viável foi a criação de cursos técnicos com equivalência ao ensino médio (antigo colegial). Cursei bioquímica no COTICAP em Campinas (hoje ETECAP).
Aos quinze anos, eu trabalhava durante o dia em Americana (onde vivia com meus pais) e a noite viajava para estudar em Campinas. Sempre fui uma aluna aplicada e minhas notas se mantiveram acima da média durante os quatro anos, o que não me garantiu um emprego na área no final do curso. Guardei meu diploma na gaveta.
Seguindo a sina da minha mãe, casei-me aos vinte anos e o sonho da universidade e da mulher independente ficou guardado por vinte seis anos. Quando a maternidade veio bater em minha porta a recebi de braços abertos. Fui a mãe suficientemente boa de Winnicott. Ao me doar nesta relação, aprendi sobre o amor incondicional e me transformei em outra mulher, agregando novos valores à minha visão de mundo.
Ao chegar à casa dos quarenta, a vida parecia estar organizada, girando de acordo com a engrenagem do tempo, acreditava estar em paz com minhas conquistas e que bastava delas desfrutar. Ledo engano, meu casamento que parecia sólido ruiu como um castelo de areia, fui soterrada pelos escombros e tive que salvar a mim mesma.
A dor de romper com o que estava certo e estabelecido forçou-me a nascer de mim mesma. Ao renascer, trouxe comigo o antigo sonho da carreira universitária e da mulher independente, aprendi com a primavera a me deixar cortar e a voltar sempre inteira (Cecília Meireles), fui então cursar Psicologia na Faculdade de Americana (FAM) - a idade não seria um impedimento, muito pelo contrário, a experiência por mim vivenciada agregaria mais valor à profissão.
Assim que conclui o curso de Psicologia (12/2011), fui fazer o Curso Livre de Formação em Gestalterapia no SATORI-GT em Campinas (2012-2013).
Em 08/2013 - 12/2013 - Conclui o Curso de Extensão Universitária de Prevenção do uso de drogas - Capacitação para Conselheiros e Lideranças Comunitárias pela Universidade Federal de Santa Catarina - modalidade de Educação à Distância.
Conheci meu atual companheiro em 2010, e entre 12/2014 a 08/2015 moramos na Inglaterra, onde ele foi fazer seu terceiro pós-doutorado, e aproveitei para estudar inglês na Oxford Hill English School.
Em 2015, de volta ao Brasil, cursei a Especialização em Psicologia Analítica Junguiana - Modalidade Extensão Universitária na Faculdade de Ciências Médica da Unicamp.
Em 2016 fiz o curso de Calatonia e Toques Sutis no Retiro Rosa de Nazaré (módulos I, II e III) em Nazaré Paulista - SP.
Em 2017 participei do minicurso "Suicídio: prevenção e manejo do comportamento suicida" ministrado pela Dra. Karina Okajima Fukumitsu - Núcleo de Gestalt Terapia Integrada de Campinas.
Em 01/2024 inicie o curso SOMATIC EXPERIENCING - O Trauma Tem Cura na ABT - Associação Brasileira do Trauma, que conta com 6 módulos (216 horas) e devo concluí-lo em 2026.
Estou aqui com uma pilha de diplomas e certificados de palestras, congressos que participei, mas citei aqueles que mais me deixaram marcas.
Winnicott acreditava que a vida foi feita para dar certo, a Gestalterapia pontua que o ser humano é um ser de potencialidade, a Psicologia Junguiana fala do processo de individuação, que é um movimento ao longo da vida, para assumir a própria identidade, naquilo que ela tem de mais autêntico e realizar seu potencial.
Nesta travessia o que tenho buscado é ser autêntica e realizar o meu potencial na medida do possível, essa lição aprendi com meus pais, antes mesmo de aprender a ler e escrever. Hoje olho para aquela que fui e já não a reconheço, e antagonicamente, observo que um traço forte foi mantido, evidenciando que minha essência não se esvaneceu, mas foi a engrenagem maleável que me permitiu todas as mudanças.
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