Era jovem, tinha muito a aprender com a vida, porém acreditava que já sabia tudo, achava que poderia colocar o mundo em uma planilha de Excel, que tudo poderia ser representado em gráficos de colunas, de barras ou circulares. A vida era uma grande prateleira com caixinhas sobrepostas e nelas acreditava que poderia guardar o passado, o presente e o futuro. Nada escaparia das caixinhas, tudo estaria empilhado na mais perfeita ordem alfabética e cronológica. E, assim, seguia rigorosamente a sua rotina anteriormente programada no Excel.
Acordava pontualmente no mesmo horário e cumpria o ritual diário como se fosse um relógio suíço, não havia espaço para eventualidades, para o acaso, para o novo.
Quando saía de férias, levava na mala a lógica do trabalho, programava rigorosamente suas atividades. Tempo e produtividade eram primos que andavam de mãos dadas. Se viajasse, levaria consigo um cronograma com horário e local que iria conhecer. Estudaria os dados e os mapas de antemão para não haver imprevistos. Não poderia perder tempo, precisava aproveitar a oportunidade e nenhum local poderia deixar de ser visitado.
Nunca demorou mais que alguns segundos diante dos jardins de Monet, o importante era ver todos os quadros da galeria. Nunca se espantou diante do cubismo de Picasso, olhou o Teto da Capela Sistina como quem olha para um bife, parou na frente de Pietá para fazer uma selfie perfeita. Na sua agenda não havia espaço para a contemplação, para o êxtase diante do belo, aquele êxtase que somos tomados diante de Moisés de Michelangelo, diante da arte que transcende o humano, nunca foi atravessado pelo silêncio do mistério, nunca teve a experiência do numinoso.
Não havia tempo para olhar o pôr do sol e suas nuances de cores quentes, nem para as cores frias da lua, se era cheia ou minguante, não importava. Borboletas, pássaros, pé de jasmim, primavera em flores eram pano de fundo para o mundo lógico e objetivo.
Não sabia lidar com imprevistos, com sentimentos, esses que nos dão frio na boca do estômago, que aceleram os batimentos cardíacos, que provocam sudorese, que nos tiram o chão. Pensava que ao controlar a vida estaria a salvo desses importunamentos.
Os sentimentos eram abstrações não mensuráveis, não cartesianos, não cabiam em gráficos ou planilhas e escapavam das suas caixinhas, chegavam sem aviso e hora marcada, pertenciam ao acaso, eram variáveis de difícil absorção, difíceis de ser compreendidas, e, assim, não podiam ser acolhidos. Ignorava que a vida não era linear, que as experiências não assimiladas voltariam, e que se não aprendesse a lição por amor, aprenderia pela dor, porque a vida não poupa ninguém. O controlador, na verdade, queria controlar a dor, por isso se tornou um controla+dor. (20/09/2021)
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