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A Jornada de Retorno: Velho Sábio ou Príncipe Covarde

Foto do escritor: Maria Angelina MarzochiMaria Angelina Marzochi

Atualizado: 12 de dez. de 2024

Envelhecer tem muitas camadas. A cada camada retirada, você descobre um pouco mais sobre o seu EU. EU em letras maiúsculas, pois é um EU único, particular, que ficou protegido pelo vigor do seu corpo, pelo resplendor da suavidade que havia em sua pele, pela sua vaidade, pela sua racionalidade, pelas roupas que você usava, pelo seu narcisismo, pelo seu egocentrismo, pelas máscaras que você escolheu usar e por tantos outros mecanismos de defesa. Porém, os dias vividos vão recolhendo cada uma dessas camadas e, assim, inevitavelmente, teremos um encontro marcado com o EU, com aquilo que há de mais profundo em nós, com esse outro desvelado em nós. A depender se você se tornou um Velho Sábio ou um Príncipe Covarde, este poderá ser um dia esperado ou um dia de desespero.


Com o passar dos anos, nosso corpo que vive sob a regência da Lei da Gravidade começa a perder a potência. Vamos descobrindo que noites mal dormidas, o álcool, o açúcar, a farinha branca, a gordura da picanha começam a cobrar pedágio. Se levarmos ao pé da letra o que os médicos e nutricionistas nos dizem, teremos que optar por uma vida quase monástica, isso é, se quisermos chegar um pouco mais longe.


A suavidade de um pêssego que havia em nossa pele vai se tornando mais próxima a uma ameixa seca. Você pode fazer uso de todas as intervenções cosméticas e estéticas que estão disponíveis, porém estas, também, têm limites de atuação. Você corre o risco de se tornar uma idosa com as sobrancelhas do Spock, personagem de Star Trek.


  Aos poucos, vamos nos deparando com os nossos limites físicos, com nossas debilidades, precariedades e com nossa insignificância diante do mundo. Outrora vivíamos a jornada do herói e agora constatamos que o mundo já existia sem nós e continuará existindo após nossa finitude. Aceitar esta verdade ajuda a curar a nossa ferida narcísica.


"Ferida narcísica" é um termo frequentemente usado na psicologia para descrever o impacto emocional e psicológico que ocorre quando a autoimagem ou o ego de uma pessoa é abalado ou ferido. Essa expressão tem suas raízes na teoria psicanalítica de Sigmund Freud, que explorou como o amor-próprio e o ego podem ser vulneráveis a desapontamentos e rejeições. Uma ferida narcísica ocorre quando alguém experimenta uma rejeição, crítica, fracasso ou qualquer evento que desafie sua autoimagem positiva. Isso pode desencadear sentimentos de inadequação, vergonha, humilhação e raiva, impactando profundamente a maneira como a pessoa vê a si mesma e interage com o mundo. A boa notícia é que a medida que envelhecemos, a opinião do outro é apenas a opinião do outro. Já experimentamos todos os tipos rejeição, críticas e fracassos que esses eventos já não nos abalam como outrora.


Deixamos de olhar só para fora e começamos a olhar para dentro. Se durante a nossa existência fomos acumulando camadas profundas do inconsciente, será assustador quando, em um belo dia, seja lá por qual razão for, essas camadas forem reveladas mesmo contra a nossa vontade (e serão). Seremos forçados a olhar para aquilo que estava debaixo do tapete. Talvez não seja uma tarefa fácil. Talvez seja mais saudável fechar os olhos para a realidade. Dissociar-se. Buscar refúgio em crenças. Entrar em negação. Colocar-se como vítima do outro.

Por ouro lado, se você foi um cavaleiro ou uma amazona corajosa, a cada camada que a vida vai retirando, há um vislumbre do EU. Algo de você começa a emergir, a mostrar-se indistintamente; pouco a pouco vai despontando algo precioso que estava escondido. Uma luz tênue se lança e ilumina o caminho de volta para casa, e, se compreendeu a travessia, voltar para casa é uma grande alegria, é lá que encontramos a paz e a satisfação de sermos quem realmente somos.

11/12/2024.

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